quinta-feira, 12 de abril de 2012

Fichamento: VIDAL-NAQUET, Pierre. O mundo de Homero. Trad. Jônatas Batista Neto. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. (p. 13-22; 121-129).

1. Pequena história de dois poemas

Existem histórias sobre a vida de Homero, mas elas são totalmente lendárias. Se ele era tido como cego é porque os antigos consideravam, talvez não sem razão, que a memória de um homem era mais extraordinária quando ele se encontrava desprovido de visão.

Sete cidades da Grécia asiática, mais precisamente da Jônia e da Eólia disputavam as honra de lhe terem dado nascimento: Esmirna e a ilha de Quios (onde ainda hoje nos mostram a “pedra de Homero”).

Existiu um Homero, dois Homeros e até, como alguns pensaram, uma multidão de Homeros? Na ilha de Quios havia os chamados homéridas, que se diziam descendentes de Homero e constituíam um grupo de rapsodos que cantavam os poemas de seu pretenso antepassado.

Rapsodo: Ele estende o bastão, num gesto oratório, e de sua boca escapam palavras ou versos de um poema épico. Homero não era um rapsodo, era um aedo.

Aedo: Significa cantor. Os poemas homéricos eram compostos e cantados por aedos que se acompanhavam com um pequeno instrumento de cordas, a phórminx.

A Ilíada e a Odisséia datam dos derradeiros anos do século IX a.C. ou já do século VIII, sendo a Ilíada anterior à Odisséia por alguns decênios. Esses poemas eram destinados a serem recitados para um auditório de homens ricos e poderosos, capazes de ir à guerra, pois no século VIII passa a existir a pólis, como um grupo de homens livres que diz “nós” ao falar em nome de todos. As cidades, nesse século, eram capazes de tomar coletivamente decisões importantes.

A fixação dos textos Ilíada e Odisséia se deu, segundo alguns especialistas, quando Pisístrato, um “tirano”, decidiu realizar uma edição oficial. Mas foi em 1488 que, pela primeira vez, os poemas homéricos foram impressos, e isso se deu em Florença, na Itália. Foram redigidos numa língua parcialmente artificial que repousa sobre dois dialetos: o jônico e o eólio. Os versos têm uma forma chamada de hexâmetro dactílico. Cada medida é composta por uma sílaba longa e duas breves (um dáctilo) ou então por duas longas (um espondeu).

2. As questões homéricas

Os antigos não a haviam propriamente levantado. Eles só tinham posto em dúvida a autenticidade de um ou de outro verso. No final do século XVII e, sobretudo, na segunda metade do século XVIII, a poesia homérica aparece então como uma poesia “primitiva”, obra não de um ou mesmo de dois poetas, mas de bardos populares que recorriam a um tesouro lendário. De imediato, a Ilíada e a Odisséia passam a ser encaradas como obras de múltipla autoria.

Porém, foi só no século XX que se descobriu pelo menos uma chave para o estudo dos poemas homéricos como poesias orais. Os personagens da epopéia não são citados simplesmente, mas são sempre acompanhados por uma série de epítetos, constantemente repetidos. Por vezes, versos inteiros e até grupos de versos são repetidos. Chama-se hoje esse estilo de “estilo formular”, descoberto por Milman Parry.

Epítetos e fórmulas têm uma função bem precisa: repousar o aedo durante a sua recitação, que adquire assim um caráter automático, e lhe fornecer “pausas” que permitam estender ou, pelo contrário, restringir a narrativa, à sua vontade.

Um estudo atendo nos mostrou, especialmente a Adam Parry, filho de Milman, que um personagem como Aquiles, o principal herói da Ilíada, usava uma linguagem bem peculiar. Ele utiliza, é verdade, o discurso formular, mas com variantes próprias. Os materiais pertencem ao estoque do repertório épico, mas a combinação é única.

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